A Região Pindaré-Gurupi - Pindaré Mirim

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segunda-feira, 1 de outubro de 2018

A Região Pindaré-Gurupi


A Região Pindaré-Gurupi

Ao longo do último quartel do século XIX, os Tenetehara do alto Pindaré e do Gurupi estavam engajados no comércio de óleo de copaíba e de outros produtos florestais de menor peso. De Monção, a ex-missão jesuítica do Acarará, o centro de comércio passou a ser a colônia de São Pedro, que foi se transformando em vila na medida em que os Tenetehara e Timbira que lá viviam iam sendo forçados a se integrar na economia regional e novos colonos lá chegavam vindos de outros estados. Após a Grande Seca de 1877-1880, como já foi mencionado, o governo provincial estabeleceu uma nova Colônia - que ficou conhecida como Colônia Pimentel - para os retirantes cearenses, alguns quilômetros a montante. Em 1880, já havia bastante cana-de-açúcar plantada na área para justificar a instalação de um moderno engenho de cana movido a energia elétrica. A antiga colônia ganhou o nome de Vila de Engenho Central, pelo qual ficou conhecido até muitos anos depois que passou a ser a cidade de Pindaré-mirim.

Durante este breve período de crescimento econômico, muita gente havia se mudado para Pindaré-Mirim e passara a subir o rio Pindaré em busca de novas oportunidades de agricultura e de comércio com os índios Tenetehara. A Colônia Pimentel cresceu e se consolidou como o maior povoado a montante de Pindaré-Mirim, e passou a ser a base dos regatões que subiam o Pindaré para negociar com os Tenetehara. Mais acima ainda, na confluência do rio Caru com o Pindaré, no local da Colônia Januária, começaram a se instalar grupos de famílias de retirantes, estabelecendo roças de subsistência e trocando bens com os índios. Porém, aparentemente, a decadência da economia regional pôs um fim à atração de novos colonos e à procura de produtos agrícolas, e o baixo preço do óleo de copaíba desmotivou a manutenção desses povoados. O povoado chamado Santa Cruz, localizada na boca do rio Caru iria se restringir a algumas poucas famílias e, por volta de 1913, se tornaria a sede de um posto indígena, desta vez criado pelo recém fundado Serviço de Proteção aos índios (SPI). Colônia Pimentel iria se manter como ponto de conecção até meados da década de 1950, quando novos povoados, como Santa Luz e Tifulândia, iriam sobrepujá-la.

Da mesma forma que o ocorrido na região de Grajaú-Barra do Corda, esse período de final de século ensejou uma profusão de relacionamentos interétnicos e conseqüentemente de mistura interracial. Os brasileiros que se mudavam para junto dos Tenetehara, desde a época que fugiam dos rescaldos das frustradas rebeliões da Balaiada e da Cabanagem, o faziam em termos amistosos porém impondo uma superioridade social ao entabular relações de compadrio e de matrimônio, ou concubinagem. Diversos dos informantes de Wagley e Galvão, em 1941-45, contavam entre seus ascendentes, pais ou avós brasileiros, muitos cearenses, que se haviam casado com mulheres Tenetehara e se tornado pessoas de importância na economia de troca local (Wagley 1942).

No rio Gurupi, os Tembé-Tenetehara, com uma população de cerca de 6.000 pessoas, em 1872, parecem ter vivido uma situação de transação econômica e miscigenação tão intensas que sua população decresceu progressivamente para 2.500 em 1890, cerca de 850 em meados da década de 1920, para menos de 300 habitantes em 1943 (SPI 1943:10, 47) e apenas 70 pessoas em 1950 . Em 1975 havia cerca de 100 Tembé-Tenetehara, quando desde então começaram a crescer, hoje chegando a mais de 200. Embora não tenhamos informações suficientemente claras para explicar esse fenômeno de populacionamento tenetehara, alguns fatores precisam ser mencionados como possíveis contribuintes. O primeiro é que, nas décadas finais do século XIX e iniciais do século XX, o rio Gurupi continuou a ser freqüentado por regatões em busca de óleo de copaíba, acrescidos então por garimpeiros em busca de ouro de aluvião. No início do século, uma companhia de mineração gerenciada por um dinamarquês conhecido por Guilherme Lund, intensificou esse relacionamento e exacerbou as tensões sociais e interétnicas a partir do médio rio Gurupi, onde se encontrava ouro nos afluentes do rio .

Um segundo fator é que, não existindo vilas, nem mesmo povoados ao longo do rio, e especialmente nas proximidades das aldeias tenetehara, é certo que muitos regatões se fixavam nas próprias aldeias indígenas, pelo menos durante uma boa parte do ano. Brusque (1862: 13-4) relatou que alguns desses regatões mandavam de fato em aldeias dos Tembé-Tenetehara, não sem deixar de provocar reações violentas. Por exemplo, ele descreveu um incidente em que sete homens Tembé atacaram e mataram vários regatões que haviam roubado algumas mulheres e espancado outros índios. Na vingança, os regatões atacaram a aldeia, incendiaram-na e seqüestraram sete crianças Tembé, as quais foram levadas para viver entre os brasileiros rio abaixo, em Vizeu. Dez anos depois, Dodt não chegou a registrar incidentes dessa natureza, mas também não deixou de reconhecer uma certa animosidade entre brasileiros e Tembé.

Um terceiro fator teria sido provocado pela migração para os lados do rio Gurupi e adiante dos agressivos índios Urubu-Ka’apor, com as famosas flechas com pontas de ferro, que chegavam atacando aldeias tembé e viajantes de canoa no rio Gurupi desde 1872 (Dodt 1981: 176). No limiar do século XX, os Tembé já não eram páreo para eles e esta desvantagem consequentemente acelerou o fator de aculturação por fazer com que as aldeias e famílias tembé buscassem proteção contra os Ka´apor, instalando-se nas proximidades dos povoados brasileiros no Pará.

Finalmente, há que se levar em conta o espocamento e a virulência de epidemias de varíola e sarampo, para diversas das quais não se tem informações, mas que se pode supor terem sido devastadoras para os Tenetehara, bem como para os Timbira e os Urubu-Ka’apor. Até a década de 1970, os relatórios de agentes do SPI, bem como de visitantes à área, são unânimes em apontar uma contínua queda populacional e uma degradação das condições de vida das populações indígenas da região, e, a rigor, por todo o Brasil. Em seus Diários índios (1996), Darcy Ribeiro relata a luta desesperada que travou para tentar ajudar esse povo no período de três meses que passou com eles, entre outubro de 1949 e janeiro de 1950, quando pelo menos 150 dos 750 índios Urubu-Ka’apor morreram da doença e de suas conseqüências.




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